24 de março de 2010

Só quando virou Milton, Bituca pôde entrar no clube da cidade

Por Natália Pesciotta

No fim do ginásio, Bituca foi o melhor aluno da turma e representou a classe como orador da formatura (na foto ao lado, o quarto da direita para a esquerda). Terminada a cerimônia, correram os formandos, alvoroçados, a se preparar para o baile de gala. Bituca, porém, pegou o diploma, a medalha, rumou para casa e fechou-se no quarto. O Clube Literário Recreativo Trespontano, da mineira Três Pontas, não permitia a entrada de negros em suas dependências.

Foi nesse dia que a proibição mais lhe doeu. Apesar de não ser a primeira vez que lhe atrapalhava a vida. Bem menino, lá pelos 14 anos, já tocava como profissional no conjunto Luar de Prata, mas não podia assistir às grandes bandas que passavam pela cidade. Ele e Dida, também músico e também negro, tentavam ouvir o som de cada instrumento sentados no banco da praça.

Bituca seguiu em frente. Fez colégio técnico em Comércio, já fora da cidade, e nunca abandonou a música. No 2° Festival Internacional da Canção, em 1967, consagrou-se Milton Nascimento. Travessia era a segunda colocada e ele, o melhor intérprete, recebia propostas de várias gravadoras. A Prefeitura de Três Pontas mandou um ônibus a São Paulo para buscar o cidadão ilustre, seu parceiro Fernando Brant e quem mais quisesse ir.

Chegando à cidade, Milton foi ovacionado pelas ruas. Para a noite, fina ironia, a Prefeitura organizara uma homenagem no tal Clube Literário Recreativo Trespontano. Por insistência da mãe, Bituca compareceu. Em tapete vermelho, passou pela porta que sempre lhe fora fechada.

Um comentário:

Inês disse...

Grande Bituca! Histórias parecidas aconteceram com, por exemplo, Don Salvador e Pixinguinha.
Ótimo blog, hein?
Um abraço!