22 de maio de 2006

“No avesso da montanha”


Mudando de assunto, vamos falar de Chico Buarque. E do seu novo disco, "Carioca”. Continua no mesmo nível dos outros, com uma diferença: não há nenhuma música que seja fácil de sair cantarolando. São canções mais melódicas e letras menos fáceis. Continua o lirismo, a crítica social sem demagogia e, sua maior característica, os versos geniais. Então, como gosto de rankings, acabei de montar o indispensável Top 10 Versos Geniais do Novo Disco do Chico.

Música: Subúrbio

“No avesso da montanha é labirinto, é contra-senha, é cara a tapa”. É maravilhoso criar a imagem de que o subúrbio carioca está no “avesso da montanha”.

“É pau, é pedra, é fim de linha, é lenha, é fogo, é foda”. Este verso nem é tão genial pela letra, mas pela forma que ele canta. Qualquer outro gritaria o “é foda” bem alto, porque qualquer palavrão em música garante sucesso fácil. Mas, ao invés disso, ele atropela a palavra, que fica quase imperceptível. Mantém a expressão e a elegância ao mesmo tempo.

“Fala Maré, fala Madureira, fala Meriti, Nova Iguaçu, fala Paciência”. “Paciência” é o último dos bairros a ser citado. Mais perfeito, impossível.

Outros Sonhos

“Guris inertes no chão falavam de astronomia”. No seu sonho os meninos no chão, ao invés de estarem muito loucos de cheirar cola, olham as estrelas.

“Maconha só se comprava na tabacaria. Drogas na drogaria”. Acho que é o verso com mais significados implícitos do disco. Além de dar uma solução pro fim do tráfico, ele “afirma” que maconha não é droga.

As Atrizes

“Dançava colada em novos pares, com um pé atrás, com um pé a fim”. Genial! A letra fala das atrizes francesas que ele conheceu em Paris, quando era criança. E, mesmo sendo mulheres que “escolhiam qualquer um e lançavam olhares” (como diz em outro trecho), Chico tentou mostrar que mesmo as mulheres “fáceis” têm essa eterna dúvida de “será que devo me entregar?” (desculpe-me a frase brega). Ou seja, “ficam com um pé atrás, com um pé a fim”.

Ela faz Cinema

“Quando ela chora, não sei se é dos olhos pra fora, não sei do que ri”. As atrizes fingem que choram. Ou, como ele disse, “choram dos olhos pra fora”.

“Quando ela mente, não sei se ela deveras sente o que mente pra mim”. Vale pela citação escondida a Fernando Pessoa.

Renata Maria

“Ela, era ela, era ela no centro da tela daquela manhã. Tudo o que não era se desvaneceu”. Enquanto a “Renata” sai do mar, sua imagem é a única coisa existente aos olhos do observador. Tudo ao redor se congela. A ponto das ondas ficarem “suspensas no ar”.

“(Quieto) como algum salva-vidas no banco dos réus”. Esse eu não entendi, mas achei genial!