30 de novembro de 2007

Samba do grande amor

Muitas sensações vêm ao peito. Poucas permanecem. Apenas a angústia se acomodou, com toda a tranqüilidade, e neste momento está lendo jornal no melhor sofá da alma preta-e-branca. Faltam dois dias para o jogo decisivo. “Pára, isto é só futebol”, exclamam alguns desavisados. Não, não é só futebol. Isto é Corinthians. O time do povo. E, tal qual o povo, cheio de imperfeições. Ingênuo, maltratado, enganado e sofrido. E só peço que domingo esse sentimento deixe em paz meu coração, que ele é um pote até aqui de mágoa.

Por falar em pote até aqui de mágoa, me lembro de algumas músicas do Chico (afinal, este é um blog musical; por força das circunstâncias o Corinthians se fez presente). Ele cantou para o povo, cantou para a massa, cantou para amenizar desesperos, cantou a favor dos injustiçados, cantou para alentar esperanças. E, agora, nenhum outro grupo social se enquadra mais neste perfil do que a torcida corintiana. Há pouco começou a tocar “Cordão” no rádio. No campo da idealização, imagino a torcida, como numa corrente, cantando no Estádio Olímpico antes da partida: “Eu não vou desesperar/ Eu não vou renunciar/ Fugir/ Ninguém/ Ninguém vai me acorrentar/ Enquanto eu puder cantar/ Enquanto eu puder sorrir/ Ninguém/ Ninguém vai me ver sofrer/ Ninguém vai me surpreender/ Na noite da solidão/ Pois quem tiver nada pra perder/ Vai formar comigo o imenso cordão”.

E que esse cordão contagie os jogadores. Que a bola estufe a rede de Sajas. Que o Felipe continue sendo o Felipe. Que o Vampeta tenha nascido quatro anos a mais do que em sua certidão. Que Lulinha seja um jogador de R$ 50 milhões. Que Dualibs e Kias da vida, que inventaram de inventar toda a escuridão, sejam esquecidos. Que os jogadores tenham precisão de flecha e folha seca. Vamos, Corinthians. Domingo, coincidentemente o dia nacional do samba, é a hora da minha gente sofrida ver a banda passar cantando coisas de amor. Um samba do grande amor.

12 de novembro de 2007

Obrigado, Iran

Pênalti infantil. Não, não é o momento de agir como criança dentro da área. Foi querer afastar o perigo numa bicicleta espalhafatosa, quase acertou o rosto do adversário e... o juiz está apontado para o cal fatal. Faltam duas rodadas. São 30 da segunda etapa. O Corinthians vai voltar à zona de rebaixamento. Não, não é o momento.

Enquanto o lateral-direito trapalhão está se sentindo culpado, como se pensasse: “Por que escolhi ser jogador de futebol? Não queria ser o culpado pela tristeza de tanta gente”, o zagueiro e capitão é a imagem da desolação. Mãos no rosto, cara de choro. Os jogadores sentem o peso da cobrança enquanto o juiz os retira da área para a cobrança.

Estou sem ar. Vislumbro o sofrimento para as próximas duas rodadas derradeiras. “Estaremos um ponto atrás”, penso. “E agora?”. Não há solução. Não há saída. O futebol me dará essa tristeza. Eu, num canto da sala, espero pela definição do lance. O jogador adversário, famoso por ser bom nas bolas paradas, corre para a cobrança. Meu coração corintiano bate no mesmo compasso da sua corrida.

Bateu! Eu, que há pouco estava olhando para baixo, arregalo os olhos. A bola parte forte. Segue rasteira para o canto esquerdo. A famosa “cobrança indefensável”, como adoram analisar os comentaristas esportivos. Prevejo a rede estufando, o que murcharia 80% das minhas esperanças. Alias, caso estufe, terei que passar a ser bom em matemática. Só com equações complexas poderia encontrar a saída.

Não estufou! O goleiro salta mais do que a matemática poderia supor. Chega no momento exato de, com a ponta das unhas, desviar a bola para a linha de fundo. A torcida explode. O goleiro começa a pular, como se tivera feito um gol. Por um segundo, para mim, o mundo é perfeito.

A equipe continua na berlinda. Caso não seja competente nas próximas rodadas, ainda pode cair. Mas, neste momento, apenas sinto que é muito bom ser corintiano. E agradeço ao Iran – o tal lateral-direito trapalhão – por ter me feito sentir tantas emoções em menos de um minuto. Obrigado.