11 de maio de 2008

Tristeza com ritmo

A base do samba é a amargura, e não a alegria. Ou, melhor: é uma tristeza com ritmo contente. É a desesperança dançante. É enganar o mal. Como diria Assis Valente no clássico Alegria, “Minha gente era triste e amargurada e inventou a batucada pra deixar de padecer. Salve o prazer, salve o prazer”.

Outro exemplo clássico é uma marchinha criada em Mangueira que se popularizou na voz de Elza Soares que, num ritmo delicioso, é posta tal letra: “Ai, ai, meu Deus! Tenha pena de mim/ todos vivem muito bem só eu que vivo assim/ trabalho, não tenho nada, não saio do miserê/ Ai, ai meu Deus, isso é pra lá de sofrer (...) E pra matar o tempo e não falar sozinho/ Amarro essa tristeza com as cordas do meu pinho”.

É o que os sambistas têm feito há quase um século. Amarrar a tristeza com as cordas do pinho e do cavaquinho. É saber que tristeza não tem fim, felicidade sim. É notar que é feliz aquele que sabe sofrer. É voltar ao jardim com a certeza que se deve chorar. É perceber que era mentira que enfim se vivia o grande amor. É pedir um último desejo.

E a última oração do parágrafo anterior é o lugar no qual se está o samba mais triste da história. Noel, e tinha que ser Noel. Sem esperança, sem alegria, sem ironia, sem retrato, sem bilhete, sem luar, sem violão. É o funeral do amor. Mas pede um inegável último desejo. Só arrepia.

Colocar a letra desta música é pouco. Abaixo segue o vídeo. Aperte o play e diga amém.

Último Desejo