17 de junho de 2010

Francis e Antonio gravaram o melhor disco de 1967

A bossa nova fez mais do que sacudir Nova Iorque em 1962, no histórico show de músicos brasileiros no Carnegie Hall. Parte mudou-se para os Estados Unidos, como João Gilberto, o grupo Bossa Três e Tom Jobim. No país, o compositor produziu discos e ensinou os norte-americanos a tocar o ritmo do momento.

Com saudade do Brasil, Tom desembarcou no Rio em julho de 1964. Tratou de retomar a vida, fazer coisas nas quais era craque. Ficar horas tomando chopes no Veloso, por exemplo. Numa tarde qualquer, porém, estava no bar quando recebeu um telefonema que mudaria sua vida por um tempo. Ao atender, demorou para crer que o sujeito que falava inglês era Frank Sinatra. A Voz o convidava para gravar um disco. E ainda pediu: "Não tenho tempo para aprender canções novas e detesto ensaiar. Vamos ficar com as mais conhecidas, os clássicos".

Era a senha para Tom voltar aos Estados Unidos. Deste encontro histórico sairia o disco Francis Albert Sinatra e & Antonio Carlos Jobim - eleito pela crítica norte-americana o melhor álbum de 1967 -, com direito a um dueto magistral em Garota de Ipanema (assista ao vídeo abaixo). Foi o segundo disco mais vendido do ano, perdendo somente para Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band, dos Beatles. A dupla se reuniria novamente em Sinatra & Company, dois anos depois.

Sinatra & Jobim - The girl from Ipanema (trad./trans.)

10 de junho de 2010

Cabo Laurindo, um herói inexistente da música brasileira

Ouça as músicas enquanto lê o texto. Vai ajudar a entender a saga desse misterioso personagem da música brasileira. A gravação é dos irmãos Chico e Cristina Buarque.

Um personagem inusitado surgiu na música brasileira em 1943. Era Laurindo, protagonista da canção homônima de Herivelto Martins composta para o carnaval daquele ano. A música era uma continuação de Praça Onze, esta primeira sobre a destruição da praça onde as escolas de samba cariocas desfilavam.

No novo samba, o personagem subia o morro comemorando: Não acabou, a Praça Onze não acabou / Vamos esquentar nossos tamborins. O nome “Laurindo” também tinha sido usado num samba de Noel Rosa na década anterior, mas a foi a partir da canção de Herivelto que começaria a inspirar outros compositores da cidade.

Afinal, quem era Laurindo? Ninguém. Ele nunca existiu, mas caiu nas graças dos sambistas da época (até hoje não se sabe por quê). O mais notório continuador da saga de Laurindo foi o sambista Wilson Batista. Com uma diferença. O compositor transformou-o num diretor de bateria da Mangueira, mas que parou as atividades carnavalescas para lutar na Segunda Guerra Mundial. Como conta a letra de Lá Vem Mangueira: Lá vem Mangueira / Sem Laurindo na frente da bateria/ Perguntei: Conceição, o que aconteceu? / Laurindo foi pro front, este ano não desceu.

Só que Wilson tratou de dar um final feliz para o soldado. Em Cabo Laurindo, em parceria com Haroldo Lobo, o pracinha voltava intacto do campo de batalha, “coberto de glória, trazendo garboso no peito a cruz da vitória”.

A história não pararia por aí. Haveria ainda uma terceira canção, Comício Em Mangueira, desta vez numa parceria com Germano Caetano. A letra e a melodia são emocionantes.

A música conta sobre um discurso do soldado logo após a volta triunfante: Houve um comício em Mangueira / O cabo Laurindo falou / Toda escola de samba aplaudiu / Toda escola de samba de samba chorou/ “Eu não sou herói” / Era comovente a sua voz / “Heróis são aqueles que tombaram por nós”.

Não faltou gente que acreditasse que Laurindo existisse de fato. Menos o compositor Zé da Zilda, que tratou de desmascarar o impostor num samba. Na letra, afirma que o sujeito é tratado como herói, porém “nem saiu de Niterói”. E que sua única participação na guerra foi a de ficar “na retaguarda aplaudindo a nossa gente”.

Depois de tantas músicas, chegou a um ponto de Wilson Batista não suportar mais ouvir sobre o herói fictício. O compositor chegou a planejar matá-lo num crime passional. Laurindo seria encontrado assassinado numa viela do morro da Mangueira, mas a canção nunca saiu.

A cantora Cristina Buarque diverte-se com a história. Cristina, que gravou parte das músicas sobre Laurindo, ainda tem dificuldade de entender por que o inexistente veterano da Segunda Guerra caiu nas graças de sambistas da década de 1940. Numa entrevista, a cantora disse, entre risos: “Comício Em Mangueira é um negócio emocionante. A volta de Laurindo, o discurso, as pessoas chorando. E é tudo mentira!”.