24 de agosto de 2007

Os 10 mais

Rankings são bacanas. Ajudam a organizar o pensamento e dar reforço visual ao que se quer expor. Portanto, crio o ranking dos melhores – ou dos que mais me emocionam, pelo menos - músicos brasileiros da história. Eis a lista definitiva:

1º - Chico Buarque

Millôr Fernandes disse no fim dos anos 1960: “Chico é a única unanimidade nacional”. E, contrariando Nélson Rodrigues, proferiu a frase de forma positiva. E é o caso. É raro encontrar alguém que, categoricamente, afirme não gostar do compositor carioca. E conquistou essa popularidade sem nunca cair no popularesco. Sem abrir concessões à sua arte. Escreve sobre situações comuns com um talento sobre-humano. Há um lirismo absurdamente forte, sarcasmo impressionante, junção de palavras sem paralelo. Todos esses elementos vêm com ausência de afetação ou demagogia. Simplicidade genial. Além de ser a única personalidade que nunca falou uma besteira grande em público (na verdade, nem pequena).

2º - Noel Rosa

O compositor é a figura mais importante para a popularização da forma urbana de se fazer samba. Viveu apenas 27 anos e, neste período, criou sambas antológicos nos quais se agrupavam vários temas. Sarcasmo, ironia, protesto, dramas amorosos. As músicas compostas para a briga com Wilson Batista (Rapaz Folgado, Palpite Infeliz, Feitiço da Vila, João Ninguém) são antológicas. Mas as minhas preferidas são as feitas para Céci, seu maior amor. A menina era, para usar um eufemismo, uma “mulher de cabaré”. E para ela compôs músicas de forte apelo, sem cair no lirismo bobo tão comum naquela época. As letras são extremamente diretas e cruas, como Dama do Cabaré, Pra que Mentir, Ilustre Visita e Último Desejo. Inigualáveis.

3º - João Gilberto

O baiano é o maior exemplo de coerência musical que se tem notícia no Brasil. Desde 1958, quando gravou o elepê Chega de Saudade e popularizou seu estilo revolucionário de cantar e tocar violão, Joãozinho (como Tom Jobim o chamava) se mantém na sua busca esquizofrênica pela batida perfeita. Canta com extrema delicadeza e precisão. Ajudou a matar a breguice musical daquela época. Influenciou decisivamente diversas gerações de músicos de primeira linha (como Chico Buarque, Edu Lobo, Baden Powell). Ao mesmo tempo, jamais se preocupou com notoriedade que não seja ligada à música. Deu menos de uma dezena de entrevistas na vida. Ficou recluso por um longo período até encontrar a batida e a forma de cantar que considerava ideais. Retira-se do palco quando as coisas não estão conforme o desejado. Pede para desligar o ar-condicionado e não gosta que a platéia cante. Ele não se preocupa com o público. Preocupa-se com a música. E isto basta.

4º - Geraldo Pereira

Pixinguinha ficou impressionado quando ouviu pela primeira vez uma música do Geraldo Pereira. Era Se Você Sair Chorando, apresentada a ele por Roberto Paiva, em 1939. O consagrado compositor, que produziu os arranjos para a canção, se disse entusiasmado com a originalidade da melodia. Mais tarde, seus sambas sincopados (uma característica harmoniosa) também chamou a atenção de outros músicos, como João Gilberto. Mas o que mais salta aos olhos (ou aos ouvidos) são as letras. Ele não era dado a romantismo lírico. Preferia a “forma cronista” de compor. Em sua obra, não há espaço pro amor romântico, pras belezas da natureza ou pro brilho da lua. Ele é objetivo, preciso e mordaz. Vide Bolinha de Papel, Escurinho, Você Está Sumindo, Falsa Baiana. Mas a música do coração é Sem Compromisso. Para mim, o maior samba da história. Une harmonia fantástica, machismo e humor sem cair no escracho. Ah, não, não. Sem Compromisso não é do Chico Buarque. Pode confiar.
No próximo capítulo: Nélson Cavaquinho e Paulo Vanzolini.

20 de agosto de 2007

"O menino que fugiu da peça" em SP

Durante este e o próximo mês (veja cartaz inilegível acima), rolará no Espaço Parlapatões, no centro, O Menino que Fugiu da Peça. Oficialmente, é uma peça de teatro voltada ao público infantil. Mas tem um humor irônico (e, às vezes, sarcástico) que agrada todo mundo. É só R$ 10. E, depois, ainda dá pra ir no sambão da Praça Roosevelt, que é do lado.
Veja resenha publicada no Guia da Semana:
O Menino que Fugiu da Peça
Espetáculo inova e foge da obviedade
A fábula escolar O Menino que Fugiu da Peça reestréia no Espaço Parlapatões e fica em cartaz até o dia 16 de setembro. Com canções ao vivo, cenários e figurinos pitorescos e derrubada completa da "quarta parede", o espetáculo procura levantar questões, tanto para os pequenos quanto para seus pais, acerca das noções de autoridade, criatividade e liberdade. O texto de Felipe Sant´Angelo, metalingüístico e provocador, leva todos os espectadores, tanto crianças quanto adultos a encontrarem identificação e questionamento nas situações vividas pelas personagens.
A peça conta a história de Denis, um menino comum, pestinha e bagunceiro, como tantos que encontramos em qualquer escola. Mas quando ele foge da peça de final de ano, seus colegas e professores entram em polvorosa e inicia-se uma divertida e emocionante busca pra descobrir como é que funcionam as complicadas relações entre professores e alunos. O grupo traz para o palco a experiência de rua que desenvolveu ao longo dos últimos anos, sempre buscando o encontro direto com o espectador, tornando-o componente ativo na realização da peça.
Onde: Espaço Parlapatões
Endereço: Praça Franklin Roosevelt, 158 - República
Quando: 18/08 a 16/09 de 2007 (sábados e domingos), às 17h
Quanto: R$ 10

18 de agosto de 2007

Conservadorismo pop

Para começar, agradeçamos a incompetência inicial do Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, ou Cansei, como preferem seus criadores. Essa versão século 21 da Tradição, Família e Propriedade escolheu como suas garotas-propaganda as popstars Ana Maria Braga, Ivete Sangalo Hebe Camargo e Regina Duarte (esta última é a mesma que disse, em 2001, que tinha “medo do Lula”). Com essas mulheres, digamos, tão defensoras de um status-quo perigoso, o Cansei perde credibilidade antes de ganhar fôlego.
O movimento sugere um envolvimento nacional contra alguns problemas. Crise aérea, violência e outros itens que ainda não ficaram claros. Apesar de obscuro em alguns pontos, é límpida sua intenção maior: criar uma oposição popular e organizada contra o Governo Federal.
Porém, é um movimento excludente e elitista. Não ouvi que se cansaram da miséria, da desigualdade econômica, do salário mínimo, das condições das favelas ou das penitenciárias parecidas com calabouços da Idade Média. Alguns dirão: “Eu ganho dois salários mínimos por mês e apoio o Cansei”. Eis o ponto. Boa parte da classe média e classe média baixa da população tem o mesmo pensamento de quase toda a elite econômica: defesa da propriedade privada, conservadorismo, tolerância à exclusão social, ao preconceito racial e ansiedade por uma “limpeza social tão necessária a este País”.
Mas, a pergunta fica: por que só se cansaram agora? O Brasil tem um Governo Federal que, se não foi escolhido uma das novas sete maravilhas do mundo, ao menos é melhor - ao se levar em conta os índices costumeiros - em décadas. Estamos fortalecidos economicamente. A miséria diminuiu. O emprego aumentou. A educação está mais democrática (mas ainda ruim, é verdade). Temos relevância externa sem paralelo na história. Ah, será que se cansaram por termos um presidente “nordestino, analfabeto e bebum”?
Em 1964, a contra-revolução que levou os militares ao poder também tinha apoio popular. Também estava cansada de sei-lá-o-quê. Também ansiava por um governo de “pulso mais firme”. Conseguiram. Espero que desta vez continuem sendo incompetentes.

5 de agosto de 2007

Escurinho

“Você só dança com ele, diz que é sem compromisso”. Alguns dizem que o samba deste verso acima é do Chico Buarque. Outros, do Noel Rosa. Há ainda os que juram ser do João Gilberto – apesar de o baiano ter feito menos de uma dezena de música na vida. Na verdade, Sem Compromisso é do genial Geraldo Pereira, autor desta e de outras músicas preciosas, como Bolinha de Papel, Cabritada Mal-Sucedida, Na Subida do Morro, Pisei num Despacho, Escurinho e por aí vai.

Adorado por quem entende de samba, desconhecido para iniciantes, Geraldo está entre os maiores nomes da música brasileira. E, só pra variar, sem o devido reconhecimento ao seu talento singular. Por esta razão, criei um blog novo só para se falar sobre este sensacional sambista mineiro-carioca:

http://geraldopereira.zip.net/

Não esperem (falo no plural como se este blog tivesse muitas visitas...) apenas análises científicas sobre sua obra. Haverá espaço para simples relatos sensoriais acerca da sua música e da sua vida. Certamente, assunto não faltará. Apareçam (...) por lá!