10 de setembro de 2008

Um homem de moral

No fim de agosto entrevistei, para a revista Almanaque Brasil, o zoólogo e compositor Paulo Vanzolini (tem até foto pra provar o feito). Antes da entrevista, alguns me advertiram: "Cuidado. O Paulo não tem muita paciência pra besteira". Acho que não perguntei muita besteira, porque conheci uma pessoa leve e bem-humorada. Contou histórias, falou dos trabalhos científicos e, principalmente, de música com empolgação.
O que mais agrada é seu jeito objetivo, sem frescuras. Faz elogios e críticas a fatos e personalidades sem mudar a expressão ou o tom de voz. Ponho abaixo alguns trechos que foram publicados no Almanaque.

Ronda
Compus Ronda em 1945, quando estava servindo o Exército. Às vezes, dava patrulha no meretrício e, sabe como é, sambista sempre está atrás de temas. Eu via aquelas mulheres indo de bar em bar, como quem procurasse algo. A música é uma piada, uma brincadeira. Vou iludindo o ouvinte, que pensa que é uma música romântica, de uma mulher que pretende encontrar o amado. Aí, no fim, o que ela quer mesmo é descarregar o pente no pilantra. Na verdade, não acho essa canção grande coisa. É meio piegas.

Música era hobby
Música para mim sempre foi um hobby, uma diversão entre amigos. Também nunca compus para gravar. O mercado da música era uma droga, muito sujo. O primeiro sambista profissional que conheci foi o Ismael Silva. Eu perguntava: "Essa música não é sua, Ismael? Não foi você que fez?". Ele respondia: "Eu fiz, mas vendi pro Francisco Alves. Então é dele". Sambas maravilhosos eram vendidos por 20 mil réis, uma mixaria.

Chico Buarque
Desde pequeno era um menino fabuloso e superinteligente. Um dia, ainda bem jovem, ele me mostrou uma música que acabara de compor, Pedro Pedreiro. Fiquei impressionado como aquela canção era perfeita. Chico é a única unanimidade nacional. Pode-se discutir a respeito de qualquer um, menos de Chico.

Vinicius de Moraes
Uma das melhores pessoas que conheci na vida. Só tinha o defeito de fazer samba nas coxas, de uma noite para a outra, quase só com emoção. Em geral, o resultado era ruim. Vinicius foi um dos maiores poetas da língua portuguesa e um péssimo sambista.

Sem exageros

Sou absolutamente contra cantores excessivos, cheios de emoção e firula. Meus sambas já têm muita emoção. Se puser mais, lambuza tudo, fica uma coisa piegas.

Sem novos sambas

Meu último samba é Quando Eu For Eu Vou Sem Pena. Por volta dos 80 anos (ele tem 84), de uma hora para a outra, perdi completamente a vontade. Não voltarei a compor. Mas já fiz mais de 60 músicas. Está bom demais.

4 comentários:

Unknown disse...

Escreve bem pra caramba esse moleque... não puxou ninguém da família.

Agosto disse...

Não sei quem você, mas merece muuito respeito, pois o Vanzolini é um dos maiores Sambistas do Brasil

Fabiano Vianna disse...

Muito Bom..... Adorei seu blog. Esta entrevista com o Paulo foi sensacional... Bruno, foi um prazer conhecê-lo.
Abraços
Fabiano..Lia.. Ó do Borogodó

Anônimo disse...

Parabéns pela entrevista.
Ainda bem que ele não tem exageros e tem a emoção na medida exata que o sentimento - amor - precisa, quer, espera, ser cantado.

"Tudo errado mas tão gostoso
De dar arrepio na espinha
Amor de galo de rinha
Amor de arrancar toco
Amor de louco contra louca
Ciume e fogo nos olhos
Beijo, o fogo na boca
E o coração, incendio pleno
Amor veneno / Amor cachaça / Amor veneno /Amor pirraça / Amor debaixo d'agua /Amor no meio dos infernos /Amor de meter susto ao padre eterno
E ja se vë
So pode ser o amor de eu e vocë"
(AMOR DE TRAPO E FARRAPO)

Tina Maria
Teixeira de Freitas/Bahia